terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

O Poder dos Jingles

Como já escreveu o bardo inglês, a vida é cheia de som e fúria. Na publicidade não poderia ser diferente: bastante fúria criativa e muita, muita música. Algumas delas compõem a trilha sonora da vida de gerações que cresceram ao som de campanhas vei-culadas no rádio e na TV - ou estão fazendo a de nossos jovens, acostumados que são a ir em busca da publicidade na internet. Há quem diga que essa publicidade cantada apenas se utilize estrategicamente de elementos musicais para sutilmente sensibilizar-nos e, objetivo alcançado!, influenciar nossos hábitos e atitudes. O recurso, toque de arte no trato com as marcas, tem nome conhecido e, em certos casos, versos e melodias cantarolados com o doce sabor da nostalgia. É o jingle, música feita para vender que - sem grandes pretensões e ao mesmo tempo repleto delas - envolve o cliente com conceitos e emoções e permite transmitir valores diversos almejados por sua “audiência”. A exemplo de status, juventude e prazer. “O objetivo é fazer o consumidor feliz e confiante em poder consumir produtos que são bem demonstrados”, afirma o radialista paulistano Carlos Racy, idealizador da Alive (www.radialive.net), primeira web rádio com programação totalmente ao vivo no mundo. E o recurso é bastante eficiente em sua missão. “Quando bem utilizado, o jingle é uma das ferramentas mais poderosas para gerar recall”,
Isso se deve ao fato de que campanhas que se utilizam de jingles para chegar mais perto do consumidor possuem maior longevidade na mídia. Afinal, propaganda que narra uma história pode ser interessante de se ouvir uma ou duas vezes. O jingle, no entanto, é como aquela canção favorita, pode ser ouvido dezenas de vezes sem perder a validade. “Com o jingle, o produto se comunica, inclusive com quem não tem chances de ter contato com a campanha impressa ou com o comercial da TV, graças ao rádio” Desde, claro, que a marca em questão dispute mercado a partir de elementos dissociados de diferenças objetivas em comparação à concorrência. “Quanto mais você se afasta da disputa de share na base do preço ou de qualquer diferença objetiva, mais você se aproxima da necessidade de ter um bom jingle em sua campanha”, afirma o compositor Garay Engels. Os jingles mexem com os sentimentos das pessoas graças à forte presença da música, característica lúdica que emociona e pode ser o diferencial de uma campanha. E como as pessoas tendem a procurar o prazer, costumam lembrar bem quem ou o que proporcionou tal sensação a elas, uma vez que a memória para eventos com componente emocional é bem melhor. “Música é uma linguagem muito antiga e nobre - não é à toa que países têm hinos, exércitos têm cantos de guerra, que rituais importantes como casamentos ou enterros sejam sempre acompanhados de música e que cada grande filme tenha uma grande música”, diz Engels.
A música pode relaxar as pessoas, apressá-las, alegrá-las ou entristecê-las, além de ser um dos poucos conteúdos que independe de meio, podendo funcionar bem em todos eles - seja na rave patrocinada pela marca, seja no jogo da seleção transmitido via internet. Sons e músicas de fundo podem realçar uma identidade corporativa ou de marca, sendo poderosos estimulantes de ordem emocional e comportamental. “Uma vez que se tem o jingle certo, ou a música certa, você tem uma enorme quantidade de possibilidades”, avalia Engels. Ora, os jingles fazem uso da linguagem musical, forma de expressão que chega a ser praticamente anterior a todas as demais formas de comunicação. Esta citada ancestralidade é o que permite à música trafegar em áreas muito primitivas do cérebro, tornando-a eficiente para comunicar emoções difíceis ou mesmo impossíveis de serem expressas em palavras ou imagens. Também é o que explica a facilidade com que a música consegue driblar as defesas racionais e desligar a atenção das pessoas na hora dos comerciais. Por isso, para conseguir comunicar, o jingle precisa ser música de fato e não publicidade disfarçada de música. “Empilhar notas bonitas não faz uma música funcionar. Jingles que funcionam são feitos por gente que sabe 'falar' usando a música como linguagem”, afirma Garay Engels.
QUE PROGRAMA LEGAL - Quem não se lembra de temas como “Pipoca na panela, começa a rebentar / Pipoca com sal, que sede que dá”; “O elefante é fã de Parmalat / O porco cor-de-rosa e o macaco também são”; “Quero ver você não chorar / Não olhar pra trás / Nem se arrepender / Do que faz”; e “Cre, cremo, cremo, Cremogema / É a coisa mais gostosa desse mundo”? Elas podem ter tocado à exaustão no rádio ou na TV, mas não garantiram sequer a última posição na lista das mais executadas nas paradas de sucesso, nem descolaram um disco de ouro a seus compositores. Por outro lado, esses jingles do Guaraná Antarctica, Parmalat, Cremogema e do extinto Banco Nacional, respectivamente, figuram até hoje na memória afetiva de milhares de pessoas em todos os cantos do país.O que tornou essas composições memoráveis ao longo de todo esse tempo? Letras simples, trilhas bem trabalhadas e o primor pelo material produzido. Mas é preciso dar os devidos créditos à mídia. Afinal, diversas inserções em veículos de massa conseguiram evidenciar e frisar os jingles, garantindo o sucesso das composições e aproximando-as ainda mais do consumidor. “Qualquer música que faça sucesso nas rádios e TVs é executada várias vezes ao dia. Repetição é fixação. Por melhor que seja o material, ele não alcançará seu objetivo sem uma boa mídia”, explica Fernando Suassuna,. “Um jingle pode ser bobo, com a letra malfeita, e não sair da cabeça das pessoas. Qual foi o segredo? Veiculação. É com essa mesma lógica que funciona a indústria da música”, afirma Airton Chaves, redator da pernambucana HSM Marketing Integrado. Apesar disso, é preciso que o jingle tenha suas qualidades, que são coerência e precisão na mensagem que se pretende transmitir por meio da exploração de imagens e sensações que não precisem do recurso visual para serem assimiladas. Junte-se a isso pertinência em relação ao público-alvo, melodia irresistível, mensagem direta e vozes carismáticas. Um bom refrão ajuda, mas nem sempre é necessário. Resumindo, um bom jingle precisa de um bom conceito de comunicação; um compositor com sensibilidade para trazer a emoção necessária na letra e melodia/harmonia; e profissionais competentes para concretizar a idéia. O inusitado também pode entrar na receita.“O comercial com jingle é quase sempre mais sedutor, envolvente. Sem o jingle ele fica mais duro'”, avalia Alexandre Leão, Como o da Tixan Ypê, feito em parceria com a produtora de áudio Play it Again (SP) e cantado pela Daniela Mercury. “O jingle dá alma à propaganda, torna a venda despretensiosa, mais solta e leve”, diz Aparecida Araújo, a Cida, da equipe de Planejamento da pernambucana Regional Promo & Comunicação. “O comercial vende. O comercial com jingle emociona, conquista e só depois vende. Ele desperta mais sentimentos e, portanto, tem mais chances de vida útil na cabeça do consumidor”, explica ela. Mas antes, é preciso que o jingle nasça. São duas as etapas habitualmente seguidas. Na primeira, é necessário um jingle bem elaborado, que contenha todas as informações sobre a campanha, o posicionamento do produto e para quem ele deve ser vendido. Ou seja, o que se quer e qual caminho deve ser seguido para se alcançar esse objetivo. “Depois é transpiração e humanidade para converter a idéia dura em uma coisa sutil e fácil de ser assimilada. Fazer e refazer até ficar bom, pois nem sempre sai de primeira”, ensina Chico Gomes, cantor, compositor e arranjador,
O DOCE MAIS DOCE - Quando o jingle é bom, quem ganha é a marca do cliente, pois ela se torna (ou fica mais) popular. E quanto mais discreto e original for a tradução do briefing para a música, aliada a uma execução eficiente na mídia, maiores as chances de sucesso. Resistências existem, principalmente por haver boas idéias musicais que fazem sucesso sem a necessidade de uma idéia publicitária aliada a elas - fato que poderia fazer crer que as idéias publicitárias são desnecessárias.“Uma boa idéia musical potencializa uma boa idéia publicitária, e vice-versa. Se a idéia musical custa 'x' e a idéia publicitária custa 'y', a combinação das duas é tão poderosa que não tem preço”, avalia Garay Engels.Tem ainda a questão dos custos. Em alguns casos, para criar um jingle são necessários publicitários, redatores, músicos, compositores, produtora, bons equipamentos e todo o efetivo que dá apoio nos bastidores. A relutância quanto ao uso do recurso pode vir ainda dos prazos apertados, da pouca disposição em se investir em bons fornecedores e do medo de ousar. O avanço da tecnologia, porém, trouxe inúmeras possibilidades para a criação de jingles. Todas a custos modestos. “Um piano é um troço maravilhoso, mas grande, pesado, 'carésimo', difícil de gravar e até de manter afinado. Um notebook serve de piano (em jingles, não em salas de concerto) com montes de vantagens”, compara Engels. Sem falar das facilidades associadas à internet. “Ela se tornou canal indispensável de contato com parcela cada vez maior do público. Música trafega velozmente na rede. Arquivos de música são leves e fáceis de manipular. A conseqüência óbvia é a que se repita aqui o que está acontecendo no resto do mundo: mais e melhores jingles, e cada vez mais grandes nomes entrando nessa”, diz Engels. Muitas vezes, os clientes aceitam bem a idéia de usar jingles em suas campanhas. E obtêm ótimos resultados com isso.
É A COISA MAIS GOSTOSA DESSE MUNDO - Oficialmente, o primeiro jingle foi produzido nos Estados Unidos, em 1926, para o cereal matinal Wheaties. Seu auge por lá se deu nos anos 1950, quando podiam ser ouvidos jingles para diversos produtos, de bebidas alcoólicas a higiene pessoal. No Brasil, os jingles encontram suas raízes nas vozes de mascates que anunciavam suas mercadorias com pregões cantados e, geralmente, acompanhados por instrumentos sonoros, como a corneta e a matraca. O primeiro registro histórico do uso de jingles no país data de 1882, quando a polca Imberibina, composta por Mariano de Freitas Brito para um medicamento digestivo, era editada para distribuição gratuita. Mas foi no rádio que o recurso teve sua popularização e auge. O primeiro anúncio do tipo foi veiculado no Programa Casé, apresentado pelo radialista Ademar Casé na Rádio Philips do Rio de Janeiro. Composto por Antônio Gabriel Nássara, em 1932, para a padaria Pão Bragança, ele trazia os seguintes versos cantados em tom de fado: “Ó padeiro desta rua / Tenha sempre na lembrança / Não me traga outro pão / Que não seja o Pão Bragança”. De 1935 data a primeira gravação brasileira de jingle em acetato. A produção, de Gilberto Martins, foi composta em São Paulo para a marca Colgate-Palmolive. Em pouco tempo, as pessoas incorporavam trechos das mensagens em seu vocabulário e cantavam ou assobiavam as melodias dos jingles pelas ruas ou no trabalho.
Desde então, muitas foram as composições que ficaram enredadas na memória afetiva de milhares de brasileiros, marcando gerações. Como a citada “Pipoca com Guaraná”, de 1991, eleita uma das “7 Mais” da propaganda brasileira em pesquisa promovida pela revista About. Existem ainda os casos de jingles que se tornaram sucessos em outro campo, o da Música Popular Brasileira. O maior exemplo vem da canção “Cheiro de amor”, do publicitário baiano Duda Mendonça. Feita para o Motel Lê Royale, na Bahia, o jingle obteve tanto sucesso que foram providenciadas cópias da música para serem dadas aos freqüentadores como brinde. Quem também se rendeu ao charme da composição foi a cantora Maria Bethânia, que a imortalizou em vinil no disco Mel, de 1979. Outro exemplo é o jingle “Garotas do Brasil”, da grife de moda feminina Via Marte, que virou tema de novela e entrou no repertório de trios elétricos. Existem ainda as canções usadas como jingles que se transformam em hits, como é o caso da Fake Plastic Trees, do Radiohead. Usada em campanha que tinha como tema crianças portadoras de síndrome de Down, ela ficou conhecida como a “música do Carlinhos” - o próprio CD dos ingleses (The Bends, de 1995) vinha com um adesivo que deixava clara a relação entre música e comercial.
DEIXA O HOMEM TRABALHAR - Mas quem disse que os jingles se prestam apenas a propagandear as vantagens de marcas, produtos e serviços. Eles também servem para “vender” pessoas. Melhor dizendo, políticos. Em época de eleição, é comum perceber candidatos apostando suas fichas na sensibilidade de músicos e marqueteiros em busca de um refrão que se torne hino de sua campanha e possa ser lembrado pelo eleitorado no momento do voto. O baixo custo de produção aliado ao forte poder de memorização tornam o recurso um dos mais utilizados no período. É perceptível na maioria das produções o uso de certos elementos, como leveza, alegria, exaltação às qualidades do candidato e demonstração do que ele pode fazer caso eleito. Tem de composições originais e adaptações de canções conhecidas da MPB a músicas que são apropriadas por completo. É o caso do frevo Voltei, Recife, de Luís Bandeira, usada por Joaquim Francisco em 1988 na campanha para a Prefeitura do Recife. Ou a Madeira do Rosarinho, de Capiba, que virou símbolo da campanha de Eduardo Campos ao governo do estado no último pleito. Caminho oposto tomou o jingle Recife Nagô, de J. Michiles, já interpretado pelo percussionista pernambucano Naná Vasconcelos. Qual a receita para um bom jingle político? “Muita inspiração, um bom refrão e uma melodia fácil. Muitos autores se perdem, porque é muito difícil atingir o belo através do simples”, afirma Lázaro do Piauí. Para o artista, porém, não há diferença entre jingles políticos e os criados para vender produtos e serviços.“Na minha cabeça, o político é um produto como qualquer outro. Como um carro, sabonete ou marca de TV”, diz. Um bom jingle político deve conter a marca do candidato, um pouco de sua história e refletir os desejos de mudança ou continuidade dos eleitores. “O grande desafio será sempre o de conseguir pegar o eleitor pela emoção. Já vi jingles que iniciaram uma verdadeira virada na percepção dos eleitores”. “Jingle é um discurso musical dirigido a um eleitor. Se for bem-feito, vai chegar ao coração dele, até mesmo antes de ter passado por sua cabeça”, afirma o publicitário Duda Mendonça no livro “Casos e Coisas” (Editora Globo, 2003). Para ele, o importante é que a música seja boa, independentemente de ser samba, rock, frevo ou qualquer outro ritmo. Diferentemente de outros publicitários, no entanto, ele defende que o candidato deva explorar diversas composições ao longo da disputa eleitoral. “O eleitor não tem que sair por aí cantando o meu jingle. Tem é que incorporar, absorver a minha mensagem. Os argumentos do nosso candidato”, escreve ele em seu livro de memórias pessoais e profissionais. Seja do candidato, seja de alguma marca, alguém ainda duvida da capacidade dos jingles em serem bem-sucedidos nessa missão? Um bom sono pra você e um alegre despertar.

Um comentário:

Ana CaTrin disse...

Boa Tarde.. Gostei da matéria sobre Jingle. A algum tempo estou entrando em contato com algumas gravadoras para saber como faço pra gravar um jingle, quero dizer, colocar minha voz no jingle. Mas todoas me pedem primeiramente uma referencia de minha voz, mas fico confusa em saber que tipo de referencia é necessária, a unica informação que eles passa é que deve ser em formato mp3. Porém não sei se devo cantar ma capela de alguma música atual, ou um jingle mais popular. enfim, peço gentilmente sua ajuda!
Grata.
Há! passa lá pelo meu blog!
www.coisasdaanacarol.blogspot.com
Paz no coração!!